sexta-feira, 26 de setembro de 2014

A luta pela moradia, o direito à propriedade, a política de habitação e a Justiça

A decisão abaixo merecer ser enquadrada. Nosso Judiciário carece de mais juízes com este tipo de sensibilidade social.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014


Moradia e conciliação

DECISÃO

Processo Digital nº:
1044530-78.2014.8.26.0100
Classe - Assunto
Reintegração / Manutenção de Posse - Esbulho / Turbação / Ameaça
Requerente:
Maria Maurano Castells e outros
Requerido:
Movimento dos Trabalhadores Sem Teto - Mtst

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Roberto Luiz Corcioli Filho

Vistos.
Trata-se de demanda possessória em face do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), tendo sido deferida a liminar, sem a oitiva da parte contrária, a fim de possibilitar a desocupação do imóvel localizado na rua Maria Paula, 181, Bela Vista, nesta Comarca, conforme fls. 141/142.
Concedido o prazo de quinze dias para a desocupação, os membros do movimento réu permanecem no local, conforme certidão retro do oficial de justiça (fls. 185), de modo que se requer a concessão de ordem de arrombamento e a expedição de ofício à Polícia Militar a fim de concorrerem com efetivo necessário a dar cumprimento forçado à liminar.
Pois bem.
Com o máximo respeito ao entendimento esposado pelo colega que me antecedeu na condução do feito, levando-se em conta a situação instaurada, havendo iminente risco de grave dano caso se efetive o despejo forçado, com a concorrência de força policial, de inúmeras famílias (inclusive idosos, crianças e pessoas com problemas de saúde), sem que se tenha oportunizado um melhor entendimento do caso por meio da oitiva dos envolvidos, permitindo-se também um momento de diálogo entre eles, o Juízo, o Ministério Público e demais órgãos públicos afetos às políticas de habitação (inclusive para a imprescindível organização de uma força tarefa de apoio social), e com vista à efetiva consideração, no caso concreto, do direito constitucional à moradia (valendo destacar que há uma ação de desapropriação movida pela COHAB em relação ao imóvel em questão, em curso perante a 6ª Vara da Fazenda Pública desta Comarca) e dos princípios da dignidade da pessoa humana e da função social da propriedade, tenho por bem em deferir o pleito ministerial (em parecer de fls. 140) no sentido de se designar audiência preliminar de tentativa de conciliação.
E para ilustrar a delicada situação que se pode visualizar em hipóteses como a presente, vale reproduzir a recente decisão do E. Superior Tribunal de Justiça que segue:

“DIREITO CONSTITUCIONAL. HIPÓTESE DE INDEFERIMENTO DE PEDIDO DE INTERVENÇÃO FEDERAL.
Pode ser indeferido pedido de intervenção federal fundado no descumprimento de ordem judicial que tenha requisitado força policial para promover reintegração de posse em imóvel rural produtivo ocupado pelo MST caso, passados vários anos desde que prolatada a decisão transgredida, verifique-se que a remoção das diversas famílias que vivem no local irá, dada a inexistência de lugar para acomodar de imediato as pessoas de forma digna, causar estado de conflito social contrastante com a própria justificação institucional da medida de intervenção. Tecnicamente a recusa em fornecer força policial para a desocupação ordenada pelo Poder Judiciário caracteriza a situação prevista no art. 36, II, da CF, pois há desobediência à ordem “judiciária”, o que justificaria a intervenção (art. 34, VI) para “prover a execução da ordem ou decisão judicial”. Entretanto, a situação em análise – que envolve pedido de remoção, após corridos vários anos, de diversas famílias sem destino ou local de acomodação digna – revela quadro de inviável atuação judicial, assim como não recomenda a intervenção federal para compelir a autoridade administrativa a praticar ato do qual vai resultar conflito social muito maior que o suposto prejuízo do particular. Mesmo presente a finalidade de garantia da autoridade da decisão judicial, a intervenção federal postulada perde a intensidade de sua razão constitucional ao gerar ambiente de insegurança e intranquilidade em contraste com os fins da atividade jurisdicional, que se caracteriza pela formulação de juízos voltados à paz social e à proteção de direitos. Com efeito, pelo princípio da proporcionalidade, não deve o Poder Judiciário promover medidas que causem coerção ou sofrimento maior que sua justificação institucional e, assim, a recusa pelo Estado não é ilícita. Cabe registrar que se cuida de caso de afetação por interesse público que se submete ao regime próprio dessa modalidade jurisprudencial de perda e aquisição da propriedade, que se resolverá em reparação a ser buscada via ação de indenização (desapropriação indireta) promovida pelo interessado. Portanto, revela-se defensável o afastamento da necessidade de intervenção federal contra o Estado e, ao contrário, parece manifestar-se evidente a hipótese de perda da propriedade por ato lícito da administração, não remanescendo outra alternativa que respeitar a ocupação dos ora possuidores como corolário dos princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, de construção de sociedade livre, justa e solidária com direito à reforma agrária e acesso à terra e com erradicação da pobreza, marginalização e desigualdade social. IF 111-PR, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 1º/7/2014 (vide Informativo n. 401).”

Assim, suspendo, por ora, o despejo (requisitando-se do senhor oficial de justiça a devolução do mandado), designando-se AUDIÊNCIA DE CONCILIAÇÃO parao dia 29 de setembro de 2014, às 15hs.
Intimem-se a COHAB e as Secretarias Municipais de Assistência e Desenvolvimento Social (SMADS) e de Habitação para que se façam representar na audiência, em colaboração ao Juízo.
Intimem-se as partes, sendo que o Movimento réu deve vir representado por até três membros (justificando-se a limitação a fim de que os trabalhos se tornem viáveis), sem prejuízo de seu(sua/s) respectivo(a/s) advogado(a/s), bem como o Ministério Público.
Por fim, diante da alegação dos autores (fls. 176 e 179/180), no sentido de que estaria ocorrendo um vazamento de água no edifício, sendo que tal vazamento, inclusive, estaria atingido o condomínio vizinho, não permitindo os ocupantes que o problema seja sanado, determino que o oficial de justiça compareça ao local (com o encanador destacado pelos autores ou mesmo pelo condomínio vizinho (fls. 184)), munido de cópia desta decisão que suspendeu a desocupação, de modo a se possibilitar oimediato conserto em questão.
Cumpra-se com URGÊNCIA.
Publique-se.

São Paulo19 de setembro de 2014.


DOCUMENTO ASSINADO DIGITALMENTE NOS TERMOS DA LEI 11.419/2006, CONFORME IMPRESSÃO À MARGEM DIREITA

quarta-feira, 15 de janeiro de 2014

Sobre o Pancadão e os Rolezinhos







O Estado garantirá a todos o pleno exercício
 dos direitos culturais e acesso às fontes
 da cultura nacional, e apoiará 
e incentivará a valorização 
e a difusão das
 manifestações
 culturais.
Artigo 215, da Constituição Federal

Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei.
Artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal

É livre a locomoção no território nacional em tempo de paz,
 podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar,
 permanecer ou dele sair com seus bens.
Artigo 5º, inciso XV, da Constituição Federal

 Todos podem reunir-se pacificamente, sem armas, em locais abertos ao público,
 independentemente de autorização, desde que não frustrem outra reunião
 anteriormente convocada para o mesmo local, sendo apenas exigido
 prévio aviso à autoridade competente.
Artigo 5º, inciso XVI, da Constituição Federal

Odeio o chamado "funk carioca". Gosto do funk de verdade de James Brown, de Parliament Funkadelic, de Stevie Wonder, de Hildon, de Cassiano, de Tim Maia, de Gerson King Combo.

O que se chama "funk" hoje em dia não foge muito do tal do "Miami Bass", que é a batida de fundo de quase todas as "músicas" e das letras pobres e apelativas que não exigem nenhum esforço de compreensão e, quase invariavelmente, ou colocam a mulher como simples objeto de exploração sexual ou vangloriam a bandidagem, ou os dois. Ruim também é o "funk ostentação", primo brasileiro do "rap ostentação" -- o lixo em que se transformou o rap estadunidense, que era música de protesto e afirmação da cultura negra e virou exibicionismo noveau riche apologético de um lifestyle materialista onde você é bom pelo o que tem (carro, mulheres de novo, correntes de ouro etc.). Se o original já é um lixo, imagine a cópia nacional em roupagem "funk".

Aí, veio o Prefeito Fernando Haddad e vetou o Projeto de Lei dos Vereadores Conte Lopes e Coronel Camilo que  visava proibir bailes "funk" em espaços públicos dizendo que "o funk é uma expressão legítima da cultura urbana jovem, não se conformando com o interesse público, à toda evidência, sua proibição de maneira indiscriminada nos logradouros públicos e espaços abertos". Que desserviço ao bom gosto, à educação musical, às crianças, à saúde, ao trânsito, ao sossego publico, senhor Prefeito; só que não

"Funk" é cultura sim, quer eu goste ou não. Posso dizer que é cultura de baixo nível, posso proibir a execução na minha casa, mas nem o Prefeito pode proibir uma manifestação cultural, nem o Governador , nem a Presidenta! As "Bachianas" de Villa-Lobos é tão manifestação cultural quanto o "Leke, Leke, Leke" -- que eu não sei quem fez. Uma manifestação não elimina a outra, dependendo de onde você está, do contexto. Quem só gosta de música erudita e só espinafra o que não curte, me desculpe, corre o risco de ser um "mala". 

Independente de eu gostar ou não gostar desse "funk" o certo é que uma parcela significativa  da juventude gosta e tem direito de usufruir do entretenimento que ele proporciona tal qual eu tenho o direito de ir à Virada Cultural e ver as minhas bandas de rock preferidas ou de ir ao parque do Ibirapuera assistir a um concerto de música erudita.

Não podemos confundir o veto à lei com uma permissividade com o barulho alto, ao consumo de drogas, ao congestionamento de veículos, à perturbação do descanso das pessoas e à bagunça geral na rua porque já existem leis que proíbem essas coisas. Não precisamos de mais leis para resolver esses problemas, precisamos de fiscalização e educação, para ficar no clichê. Aliás, para quem sente falta do império da lei (que há chegar ao coração do Pará), uma lei sancionada por Haddad neste ano, que também foi proposta pelo Coronel Camilo, proíbe a emissão de ruídos de aparelhos de som de carros estacionados.

Assim, é evidente que o espírito do projeto estava imbuído de preconceito, pois proíbia qualquer tipo de "baile funk" em espaços públicos, não dando margem para que a Prefeitura autorizasse um evento desse em nenhuma condição, até porque o projeto de lei dizia que a proibição era para qualquer horário.

Continuo não gostando do "funk carioca", mas o prefeito governa para todos e não só para os que têm o mesmo gosto que eu.

Outras medidas imbuídas de preconceitos são as liminares concedidas contra os "rolezinhos", que, ao meu ver, não constituem um movimento, mas sim um evento, no qual os jovens da periferia resolvem pelas redes sociais ir em grupos aos shopping centers para apenas e tão somente "tirarem um lazer", se divertirem em espaços abertos ao público.

"Nossa, mas eles vão em bando!" Pois é, a Constituição Federal lhes dá o direito de se reunirem em quaisquer locais abertos ao público.

"É, mas eles não compram nada!" Então, você pode "entrar só pra olhar", eles não?!

"Tá, só que eles espantam os clientes, que ficam com medo." Ahã, então os clientes não podem conviver com jovens, negros, pobres, de periferia. Como é que se chama isso mesmo? Ah, lembrei: preconceito -- para não dizer racismo.

Me parece, não tenho nenhuma comprovação disso, que o fenômeno "rolezinho" tem a ver com a ascensão social dos miseráveis ocorrida nos últimos dez anos no Brasil, que possibilitou o acesso a bens culturais e de consumo a um povo que antes não tinha condições para tanto. Por mais que os jovens da periferia não estejam dando o "rolezinho" para ir às compras, eles devem se sentir minimamente "empoderados", com um certo nível de autoestima, que ir ao shopping dos bacanas não seja mais uma coisa tão assustadora assim. Em que pese, talvez, lhes faltar coragem para irem sozinhos ou apenas com  alguns amigos a esses templos de consumo. Ir em grupos grandes dá mais coragem, o sujeito fica meio escondido na multidão, "é mair legal"! Além do que é natural do jovem desafiar o estabelecido e criar coisas novas.

Outra questão que o "rolezinho" escancara é a falta de alternativas de entretenimento e cultura para essa juventude na cidade. Convenhamos, existe coisa mais insípida, insossa, pausterizada, capitalista e esnobe que shopping center? Em outras palavras, existe coisa mais paulistana?

Vai daí que questiono o seguinte: a ascensão social ocorrida nos anos Lula/Dilma está sendo acompanhada por um aprimoramento da consciência de classe ou estamos apenas inserindo as pessoas no mercado como consumidores e não como cidadãos?

Os jovens estão procurando aquilo que a ideologia dominante diz que é bom e o bom é ir ao shopping ter tênis de marca, agregar valor no camarote, ter um carrão -- de preferência com um puta soundsystem para ouvir "funk" beijando a "popozuda". Só que, não se iludam, que a classe operária ainda não foi admitida no paraíso -- onde apenas estudantes da FEA/USP e que tais podem entrar impunemente para realizarem intervenções extraordinárias. Enquanto isso, o brado de Lemmy Kilmister continua retumbando: "Eat The Rich" e, pelo jeito, a burguesia dos shoppings não quer que exista amor em SP.

quinta-feira, 12 de dezembro de 2013

Os 45 Anos do AI-5

"Nas trevas da clandestinidade não
 havia resposta possível que não
 a do combate pelas armas."
Jacob Gorender


13 de dezembro de 1968 - 13 de dezembro de 2013.

Este dia tinha que cair numa sexta-feira. Dia amaldiçoado para a nação brasileira. Dia para ser lembrado. Para que nunca, nunca mais aconteça. Tortura Nunca Mais.

Em tempos nos quais pessoas de destaque no meio cultural como o cantor Lobão minimizam a gravidade da tortura, chamando-a de "arrancar umas unhazinhas" e que quase afirmam com todas as letras que a Ditadura Militar foi necessária para barrar a Ditadura Comunista é bom lembrar para por os pingos nos "is".

Primeiramente, a luta armada só ocorreu porque o governo proibiu qualquer manifestação contrária à Ditadura, até mesmo as pacíficas, como as passeatas que costumavam ocorrer até então (diga-se de passagem, sem black blocks, sem qualquer depredação de patrimônio público).

A Ditadura resolveu nessa data por em prática o "cala a boca", o "sofre" e o "morre, desgraçado". Nesta semana, a Comissão da Verdade Vladimir Herzog, da Câmara Municipal de São Paulo, divulgou que acredita ter fortes indícios de que o ex-presidente JK não morreu em acidente automobilístico, mas foi assassinado na Rodovia Presidente Dutra.

Como antecedente do AI-5, ainda não dá pra deixar de lembrar da Greve dos Operários da COBRASMA, empresa metalúrgica da cidade de Osasco, primeiro enfrentamento da classe trabalhadora contra os patrões  e o Regime Militar, que antecedeu  em dez anos as primeiras greves de metalúrgicos de São Bernardo que fizeram Lula conhecido em todo o país.

Em 02 e 03 de setembro de 1968, o deputado do MDB pelo estado da Guanabara, Márcio Moreira Alves, fez pronunciamentos que irritaram os milicos e fizeram com que eles solicitassem a cassação do parlamentar. A Câmara rejeitou o pedido do Poder Executivo e no dia seguinte, em represália, veio o Ato Institucional n. 5, o AI-5.

Foi porque sentiram que perderiam o controle da situação, que os militares endureceram e por intermédio do AI-5  criaram a possibilidade de suspensão arbitrária de todos os direitos políticos dos brasileiros.

Ele previa que o presidente Costa e Silva -- e depois Médici,  e depois Geisel, e depois Figueiredo, pois o AI-5 ficou em vigor por dez longos anos -- podia decretar o recesso do Congresso, intervir nos estados e municípios, suspender os direitos políticos de qualquer brasileiro, suspender o Habeas Corpus por razões políticas e outras medidas, tudo sem necessidade de solicitar autorização ao Poder Judiciário. No mesmo dia 13 de dezembro, o Presidente usou uma das prerrogativas que ele mesmo lhe dera e decretou o recesso da Câmara dos Deputados e do Senado.

O ato também suspendeu a vitaliciedade, inamovibilidade e estabilidade dos juízes, acabando com a sua independência.

Como advogado que sou, acho importante ressaltar o papel  do então ministro da Justiça, Luis Antonio da Gama e Silva nessa história. Foi ele quem propôs o ato e na verdade defendia até medidas ainda mais  autoritárias, como o fechamento do Congresso e do Poder Legislativo em todo o país e o recesso do STF. Foi ele quem fez o anúncio em rede nacional. Esse senhor de triste memória era paulista, professor de Direito Internacional da Faculdade de Direito do Largo de São Francisco e ex-reitor da USP.

Outra figura, esta ainda presente no cenário (Gama e Silva morreu em 1969), foi Delfim Netto, então Ministro da Economia. Em sessão da Comissão da Verdade da Câmara Municipal de São Paulo ele disse não ter se arrependido de ter votado a favor e de ter assinado o AI-5.

A partir desse Ato Institucional a repressão recrudesceu e provocou o surgimento dos grupos armados que tinham como objetivo a derrubada da Ditadura pela força, já que os direitos políticos foram restringidos e não havia a possibilidade de contestar o governo por meios pacíficos, muito menos de trocá-lo pelo voto.

Para além dos efeitos jurídicos, o AI-5 permitiu que a linha mais dura do governo ditatorial fosse à caça dos comunistas e "subversivos" com o claro objetivo genocida de destruí-los, eliminá-los.



segunda-feira, 19 de março de 2012

Revolta Adolescente


A música Teenage Riot  é um clássico daquela que já foi chamada de “banda mais alternativa do mainstream”, o Sonic Youth. Eddie Vedder, vocalista do Pearl Jam, selecionou-a para a coletânea lançada em 2008, Hits are for squares e sobre essa canção escreveu, o que numa tradução livre, pode ser o seguinte: “Eu sou de Seattle, mas  foda-se o café... fodam-se as vitaminas, os sucos orgânicos e a nicotina. Pela minha experiência nada te põe mais ligado como colocar Teenage Riot no volume máximo. De 0 a 60 e deixe ficar. Coloque pra tocar duas vezes e você terá limpado a casa e varrido tudo pra calçada. Em um carro, você se descobrirá  a 150 km/h e obrigado a encostar antes do primeiro refrão. Tente... mas por favor tenha certeza de que você tem dinheiro para arcar com as multas de velocidade. Eles não permitem Walkmans na cadeia.”  

É bem isso.

À época em que foi lançada, o Sonic Youth ainda não era mainstream e a música rapidamente se tornou um hino da galera roqueira indie, aqueles meninos e meninas que formavam bandas como coelhos fazem filhotes e achavam que com suas guitarras barulhentas iriam derrubar os jabás e os engravatados da indústria fonográfica, ou ao menos - os mais espertos -  nem estavam aí pra eles. Tratava-se de fazer um som que tivesse identidade entre os jovens, criar uma irmandade, com um circuito de locais para tocar ao vivo para a mesma galera e gravar suas músicas por gravadoras independentes (daí o nome indie). Estávamos em 1988. Quatro anos depois uma outra música com a palavra teen no título – de outra banda estadunidense devotada ao SY - abalou as estruturas do mundo do rock. Teenage Riot é a faixa número um do álbum Daydream Nation, que entrou para o Registro de Gravações Nacionais da Biblioteca do Congresso estadunidense em 2005. O Registro está atualizado até 2010 e traz, por enquanto,  gravações significativas  de 1853 a 1995. Daydream Nation foi lançado originalmente pela Enigma Records e representa uma transição da banda para o mainstream. A gravadora era a mesma do Poison, mas também do Agent Orange, T.S.O.L., Devo, GG Allin e Slayer. Anteriormente o SY gravava pela SST Records, do ex-Black Flag, Greg Ginn (não confundir com Greg Griffin, shaper de pranchas de surf, nem com o Greg Graffin do Bad Religion). Mais tarde, e menos de um ano depois do lançamento de Daydream Nation, o Sonic Youth assinava contrato com a major label David Geffen Company, a mesma do Guns  n’ Roses e posteriormente a mesma daquela outra banda da música com teen no título, que aliás teve o seu disco onde está esse som na mesma lista registrada na Biblioteca do Congresso; mas isso é outra história.

Teenage Riot parte do sonho de ter Jay Mascis, do Dinosaur Jr., como Presidente dos Estados Unidos (na esteira de Jello Biafra, do Dead Kennedys, ter sido candidato à Prefeitura de São Francisco, na Califórnia, possivelmente).  A letra fala da urgência de se fazer algo para impedir que as escolhas de sua vida sejam feitas por outros que não você mesmo. Fala da necessidade de se armar (com instrumentos musicais?). O metrônomo é capaz de hipnotizar um adolescente e fazê-lo juntar-se à horda revoltosa. O silêncio incomoda. Quem vai apontar o caminho (Jay Mascis)?  Sozinho não se alcança nada. Nada. No início da música Kim Gordon, a bela baixista, recita frases meio a esmo, entre o dedilhado da guitarra nos acordes calmos de Thurston Moore e Lee Ranaldo e com a bateria de Steve Shelley dando o ritmo. Kim repete várias vezes as expressões Spirit desire e We Will Fall, numa óbvia citação dos Stooges, ao final. Nesse momento a guitarra  de Moore irrompe do quase nada silencioso e a rapidez comanda a levada da segunda guita, da batera e do baixo que entram a seguir, seguindo a mesma estrutura dos acordes do início. Após o 13º refrão vem uma parte instrumental fortíssima, acelerada e pegajosa, que em seguida diminui a velocidade antes de ingressar nos últimos refrões. Haja fôlego!

O videoclipe oficial não tem a parte inicial da Kim Gordon. Entra direito na pauleira. É uma espécie de manifesto, panfleto imagético no qual desfilam os ídolos da juventude sônica: Patti Smith, Butthole Surfers, Kiss, Black Flag, Elvis Presley, Sun Ra (cuja Arkestra tocou recentemente em São Paulo), Stooges, MC5, Harvey Pekar... Música e quadrinhos.

Parte significativa da adolescência de muitos que, como eu, amam o Sonic Youth, se deu ao som de Teenage Riot. Quanto à banda,  - já longe da juventude etária - que esteve no Brasil no fim do ano passado para tocar no SWU num show que fez jus ao primeiro no país durante o extinto Free Jazz, não acabou com o divórcio de Thurston Moore e Kim Gordon. Pelo menos por enquanto. Os integrantes devem ter se condoído de seus fãs, já que muitos cometeriam suicídio não suportando a extinção em tão pouco intervalo de tempo de duas bandas emblemáticas do rock com atitude dos anos 80 – não nos esqueçamos do fim do R.E.M. O website oficial do SY anuncia datas de shows de turnê até pelo menos 07 de abril de 2012, na Cidade do México. É mais pertinho que os EUA. Alguém paga a minha passagem? Back on the road on the riot trail.

sexta-feira, 9 de março de 2012

60º ano da morte de Alexandra Kollontai


É curioso que um dia após o Dia Internacional da Mulher tenha morrido a mulher que primeiramente reivindicou o 8 de março como o Dia Internacional da Mulher. Há exatos 60 anos falecia Alexandra Kollontai, no dia 09 de março de 1952. Mas quem hoje se lembraria de uma pessoa falecida há tanto tempo, "jogada na lata de lixo da história", já que foi uma comunista soviética de primeira hora? Poucos. Eu mesmo só me apercebi da efeméride porque queria postar uma frase sua no Facebook, por ocasião da proximidade com a data de ontem. Daí então, pesquisando sobre a sua vida é que descobri que hoje faz 60 anos de sua morte, então como não li nada sobre ela na data de hoje em lugar nenhum (seria demais imaginar que o Google fizesse uma logomarca personalizada, um doodle), resolvi eu fazer a minha homenagem. A quem interessar possa.

Alexandra Kollontai foi uma das mais importantes ativistas da reivindicação e promoção dos direitos das mulheres de fins do século XIX e do século XX. Ela participou ativamente da revolução russa, apesar de sua origem aristocrática. Seu pai era general do Czar.

Casada, insatisfeita com a vida de dona-de-casa, dedicou-se à literatura, tendo escrito um romance que retrata as infelicidades de uma jovem mulher de sua época.

Cansada da "tirania do amor", deixou o marido e o filho para ingressar na vida política e poder estudar Economia na universidade. Também trabalhou como voluntária, conhecendo de perto a situação de pessoas extremamente pobres.

Ainda no século XIX, ingressou no Partido Social Democrata Operário Russo, de viés marxista.

No início do século XX esteve em Paris no mesmo período em que Rosa Luxemburgo lá esteve.

Em 1905, de volta à Rússia, presenciou in loco o "Domingo Sangrento" em frente ao Palácio de Inverno, no qual operários em passeata pacífica foram massacrados pelas forças do Czar.

No ano de 1906 participou do Congresso da Internacional Socialista como única delegada da Rússia e iniciou um trabalho para reivindicar o 8 de março como dia internacional de lutas das mulheres operárias, em homenagem às mulheres estadunidenses queimadas em um incêndio criminoso numa fábrica de Nova Iorque.

Alexandra foi uma das primeiras mulheres a batalhar pela organização setorial das mulheres no seio do movimento operário, promovendo comícios específicos de mulheres.

Foi presa política na Alemanha e na Suécia antes da revolução de 1917.

Em 1917, foi a primeira mulher eleita para o Soviete de Petrogrado e editou o jornal A Operária, além de organizar o primeiro congresso das mulheres operárias de Petrogrado.

Com a revolução vitoriosa e a tomada do poder pelos bolcheviques, Alexandra foi eleita para a Assembleia Constituinte e logo depois foi nomeada Comissária do Povo do Bem-Estar Social, o equivalente ao cargo de Ministra. Aliás, a única mulher no ministério do primeiro governo revolucionário. Nessa condição e daí por diante, ela responsabilizou-se pela aprovação de um conjunto de leis que determinavam a igualdade salarial entre homens e mulheres, a criação de direitos de assistência, a aprovação de creches, o direito ao voto para as mulheres, a direito ao divórcio e ao aborto. Foi também Comissária do Povo para a Segurança (ou Assistência) Social, tendo promovido também medidas para a proteção da infância e da maternidade.

Assim como Che Guevara, não tinha apego a cargos políticos, e, ao divergir de Trostsky na condução da Iª Guerra Mundial (o comandante do Exercito Vermelho defendia a assinatura de um tratado de paz bilateral com a Alemanha), renunciou ao cargo de Ministra. Contudo, não abandonou a militância política e organizou o Primeiro Congresso das Mulheres Trabalhadoras de Toda a Rússia, no qual foi criado o Departamento de Mulheres do Partido Comunista. Não foi a primeira a dirigir o Departamento, mas foi a Segunda.

Em 1922, Alexandra Kollontai aderiu à Oposição Operária, defendendo uma desburocratização do partido e maior liberdade de discussão política para todos. Como prêmio, foi destituída do cargo no Departamento de Mulheres, mas logo em seguida foi designada para a carreira diplomática, tendo sido pioneira, mais uma vez nessa área.

Ela tem uma vasta obra, não apenas novelística, mas também na área da economia política, da psicologia social e da política, com títulos como A situação da classe operária na Finlândia, Base social da questão feminina, Sociedade e maternidade, Quem precisa da guerra?, A classe operária e a nova moral, A nova mulher, O comunismo e a família e A moral sexual.

Sobre o Dia da Mulher, Alexandra tem um texto, com o mesmo nome, escrito em 1913, no qual escreveu: "O Dia da Mulher é um elo na longa e sólida cadeia da mulher no movimento operário. O exército organizado de mulheres trabalhadoras cresce a cada dia (...) Uma força poderosa! Uma força com a qual os poderes do mundo devem contar quando se põe sobre a mesa o tema do custo de vida, da segurança da maternidade, do trabalho infantil ou da legislação para proteger os trabalhadores".
 
 
 
 
 


sábado, 4 de fevereiro de 2012

Brasil é não é

Brasil é Chico Science & Nação Zumbi.
Só pra lembrar que não é só Michel Teló.
Brasil é Gilberto Gil.
Só pra lembrar que não é só Ivete Sangalo.
Brasil é Glauber Rocha e Nelson Pereira dos Santos.
Só pra lembrar que não é só Bruno Barreto e Daniel Filho.
Brasil é Frei Beto.
Só pra lembrar que não é só Gabriel Chalita.
Brasil é Caio Prado Júnior.
Só pra lembrar que não é só Henrique Meirelles.
Brasil é Fábio Konder Comparato.
Só pra lembrar que não é só Ives Gandra Martins.
Brasil é você.
Só pra lembrar que não sou só eu.
Ufa, Brasil.

quarta-feira, 11 de maio de 2011

Bobama

Pessoal, cadê o Gardenal?
Quem morreu foi o Osama ou o Obama?
Bob Marley morreu porque além de negro, era judeu.
Michael Jackson não mais existe,
Mas o Obama, além de Presidente, ficou triste.